Fazes-me falta.

É meia noite e meia, mas hoje nao vou consguir dormir sem falar contigo. E como a única forma de me expressar é por escrita, cá vai...

"CARLOS MONTEIRO FERNANDES

(1966-2010)

　

"O sentido último para que remetem todas as estórias tem duas faces:

a continuidade da vida e a inevitabilidade da morte."

Italo Calvino, in Se numa noite de inverno um viajante

A sua família agradece aos que o cuidaram nos últimos momentos de vida;

a todos aqueles que lhe manifestaram solidariedade neste momento de dor;

e aos que prestaram, de uma ou outra forma, sentidas homenagens a este seu ente querido, que permanecerá para SEMPRE,

nos nossos corações,

como um ANJO luminoso, constante e insubstituível. "

Foram estas as palavras que saíram no jornal, uns dias depois de partires. Quem me dera que nunca tivessem lá estado, quem me dera. Eu nao gosto da missa, nao acredito em deus, nem neste, nem em nenhum. Sabes disso muito bem, mas também sabes que sou "obrigada" a ir à missa porque o meu irmão tem catequese e como é piquinino tenho que o acompanhar. Faço um enorme esforço para entrar naquelas quatro paredes de pedra, fogo, se faço... Como eu ia a dizer, uma das coisas que mais me custa quando estou na missa é no fim, quando o padre vai ler a agenda para a semana seguinte ele lê tambem as missas que vai rezar. E eu começo a transpirar com medo de ouvir o teu nome. Quantas vezes tenho que ir lá para fora apanhar ar. Nao sei, mas nao gosto que te reze missas, nao gosto nem quero. Irrita-me, mete-me raiva. Fico chateada o resto do dia. Nao sei lidar com a tua morte. Nao sei viver com ela. Para mim estas aqui, nao te deixo partir, nao consigo. Quando as pessoas dizem "O Carlinhos gostava" ou " O Carlinhos era" ou " O Carlinhos tinha", nao, nao e nao! Está errado! É " O Carlinhos gosta", "O Carlinhos é" e "O Carlinhos tem". Tu estas aqui. Meu anjo, estas aqui. Nao imaginas o quanto me faço de forte, o quanto me custa nao partilhar a minha dor com mais ninguém, nao imaginas. Tenho saudades tuas, este natal foi horrivel. O que é isto sem ti? Tio, isto para mim acabou. Quero-te aqui, agora! E depois, de repente, começo a tratar mal toda a gente sem ninguém ter culpa e saio da cozinha da avó, vou para a casa de banho, abro a janela e choro. Choro e digo " dá-me um sinal para eu saber que estas aqui" e o que mais quero é que me apareças à frente, me digas que foste viajar e me abraçes, infinitamente me abraçes. Eu gosto de ti, gosto muito. Fazes-me falta. Volta, tio. Volta.

Chama-me "ninha" outra vez; tira fotos até mais nao; dança salsa comigo; liga-me todos os dias como o habitual; grava-me filmes, séries; compra-me cds naquela discoteca ao pé do Carlton; dá-me a mão e leva-me à Casa das Prendas; diz que adoras a minha barriguinha gordinha; chama-me preguiçosa; ralha comigo por gastar tanta água a tomar banho e olha-me nos olhos e diz-me que nunca mais me vais deixar.

Fazes-me falta.

Quero voltar a rir-me contigo e a sorrir-te por estares comigo.